Wally estava nervoso. O entrevistador tinha acabado de perguntar a sua pretensão salarial para o cargo de Gerente de Processos. Ele pensou: Preciso falar um valor alto. Não tenho a menor ideia de quanto as pessoas ganham lá. Mas sempre me disseram para jogar o valor para cima para causar uma boa impressão. Além disso, se eu falar um valor abaixo do que eles pretendem me pagar, vou receber menos do que eu poderia.
A minha pretensão é R$ 15.000,00 – disse Wally, confiante.
Ele foi contratado. Doze meses depois, a empresa percebeu que o trabalho de Wally não valia o salário que ele recebia. Ele foi demitido.
A história de Wally é triste, porém não é incomum. Se ele soubesse a remuneração dos seus futuros colegas no momento da entrevista, poderia ter feito uma proposta mais consciente. Mas por que as organizações escondem os salários a 7 chaves?
Verdades inconvenientes ocultadas nos contracheques
Atrás dos contracheques existe uma realidade amarga. Ela não aparece nos holerites individuais, mas na comparação entre eles. A estratégia de tornar a remuneração um assunto secreto, evita questionamentos. Ninguém vê que as mulheres ganham em média 30% menos ou a diferença de 300 vezes entre o salário do presidente e do estagiário. Ninguém vê que existem pessoas com aparentemente as mesmas habilidades, experiências e responsabilidades, que no entanto recebem valores completamente diferentes. Ninguém vê.
Por maior que seja o seu esforço em criar um plano de cargos e salários justo e coerente, distorções irão aparecer ao longo do tempo. Como vimos no caso do Wally, é comum que a remuneração seja determinada em uma negociação. Mesmo que exista uma política ou fórmula, alguns vão escapar dela. Afinal, ninguém vê. E como ninguém vê, ninguém se manifesta.
A falta de visibilidade também dá margem à imaginação e conversas de corredor. “Você viu que o primo do diretor está trabalhando aqui? Ouvi falar que ele está ganhando um salário astronômico.” Se você tem um negócio social com um propósito forte, multiplique esse problema por 10. As pessoas vão demandar ainda mais coerência.
Protegendo as pessoas
Nós precisamos proteger as pessoas. Elas não estão preparadas para lidar com isso. Não podemos jogar essa realidade vergonhosa na cara de todos.
É o que a área de Recursos Humanos diz. Mas isso parece a frase de um pai, querendo proteger os seus filhos da crueldade do mundo. Hey, isso quer dizer que nós somos crianças? Incapazes de compreender os critérios de mercado que regulam os salários, por mais que discordemos deles? Ou com o fato de que a desigualdade social também existe nas empresas, que são microreproduções da sociedade?
É confortável viver com essa ilusão, jogando a responsabilidade de resolver esse problema para o seu gestor ou para o RH.
Revelando o quanto cada um ganha
Algumas organizações estão testando abordagens diametralmente opostas à privacidade salarial. É o caso da Buffer, que leva a transparência a sério. No site deles você encontra o salário de todos os membros. Aberto. Público. Na internet. Não só salário, mas ações, receita, captação de recursos, preço dos produtos, emails e roadmap do que está sendo construído. Isso não é só uma inovação da Buffer, mas um movimento. O próprio manifesto das organizações responsivas aborda a transparência como um dos seus 5 pilares:
Hoje, temos acesso a tanta informação que se tornou impossível prever qual informação poderá ser útil ou quem poderia utilizar esta informação de uma forma produtiva. Neste mundo, de informações abundantes e conectividade, os benefícios potenciais de confiar nas pessoas que compartilham do propósito da organização, para que ajam sobre as informações da forma que julgarem melhor, geralmente ultrapassam os riscos potenciais de informações abertas serem utilizadas de uma forma contraproducente.
O que uma organização ganha em revelar os salários?
Eu posso listar alguns bons motivos para você pensar sobre remuneração transparente. Ao revelar salários, você tende a:
- Diminuir as diferenças absurdas entre salários dos executivos e base;
- Diminuir as diferenças de salário por gênero;
- Aumentar a confiança de todos na organização;
- Encorajar as pessoas a pedirem aumentos mais coerentes;
São bons benefícios, mas não pense que basta enviar a “planilhona” para todo mundo, especialmente se existirem diferenças grotescas. Você vai precisar de um plano de transição. Além disso, você vai ter que entender se as pessoas estão dispostas a ter o seu salário revelado. É mais fácil começar uma organização com transparência salarial do zero, pois assim você já estabelece essa condição no início da relação de trabalho.
Buscar transparência e critérios universais para a remuneração tende a gerar uma sensação de justiça maior, ainda que os questionamentos sejam constantes. Mas quando é transparente, todo mundo vê. E com todos vendo, temos mais olhos atentos a desvios e incoerências.
Pronto para trazer esse assunto em questão na sua organização? Nós estamos.