Imagine a cena: você, líder, à frente de uma equipe de alta performance, repleta de talentos individuais. Todos são brilhantes, motivados e com um objetivo em comum: alcançar resultados incríveis. Mas, em vez da sinergia e colaboração esperadas, você se depara com disputas por poder, egos inflados e conflitos que parecem surgir do nada. A frustração toma conta, a produtividade despenca e você se pergunta: “Onde foi que eu errei?”.
A resposta pode estar mais perto do que você imagina: na própria estrutura hierárquica da sua organização.
Sim, você leu certo. Aquela hierarquia que você sempre considerou essencial para a ordem e a eficácia, aquela que te ensinaram a respeitar e a reproduzir, pode estar, na verdade, sabotando o potencial do seu time, agindo como uma armadilha invisível que impede o crescimento e a capacidade de resposta da sua organização.
A Fábrica de Conflitos
“Mas como isso é possível?”, você pode estar se perguntando. Afinal, a hierarquia não deveria garantir a coordenação, a clareza de papéis e a eficiência? Não é o que dizem os livros e os gurus da gestão?
Acontece que a realidade é bem mais complexa do que os modelos simplistas que costumamos seguir. Uma pesquisa abrangente, que analisou mais de 50 estudos sobre hierarquia em equipes, com dados de mais de 13 mil times, revelou uma verdade chocante: na maioria das vezes, a hierarquia tem um impacto negativo no desempenho e na viabilidade das equipes.
A hierarquia, ao invés de promover a harmonia, muitas vezes acende a faísca da competição e do conflito. Quando as pessoas são divididas em níveis de poder e status, a busca por ascensão, o medo de perder posição e a sensação de injustiça se tornam ingredientes perfeitos para um caldeirão de tensões.
E os dados da pesquisa corroboram essa perspectiva. Os estudos mostram que a hierarquia aumenta significativamente a probabilidade de conflitos, especialmente em equipes com alta rotatividade de membros, com profissionais de diferentes áreas de especialização ou quando os critérios de ascensão na hierarquia são subjetivos e mutáveis.
Pense na sua equipe: você tem vivenciado disputas frequentes por recursos, divergências sobre quem tem autoridade para tomar decisões ou resistência às ordens dos superiores? Se sim, a hierarquia pode estar diretamente relacionada(o que não significa que ela é a causa de todos os problemas).
Desvendando a Armadilha: Quando a Hierarquia Atrapalha Mais do que Ajuda
Para entendermos melhor esse paradoxo, precisamos mergulhar nas raízes da nossa crença na hierarquia. Afinal, por que ainda acreditamos que ela é essencial para a organização e o sucesso das equipes?
A resposta está em nossa história. A hierarquia é um modelo social milenar, presente em diversas culturas e civilizações. Fomos ensinados, desde cedo, a respeitar a autoridade, a seguir ordens e a nos conformar com nossa posição na escala social. A hierarquia nos foi apresentada como a “ordem natural das coisas”.
Como a hierarquia aumenta os conflitos:
- Competição por poder e status: a estrutura hierárquica, por sua natureza, cria uma competição por posições mais altas e recursos limitados.
- Diferenças de interesses: a hierarquia coloca as pessoas em diferentes níveis de poder e influência, o que leva a perspectivas e prioridades distintas.
- Percepção de injustiça: se a hierarquia não for percebida como justa e legítima, pode gerar ressentimentos e conflitos entre os membros da equipe.
E essa crença se refletiu também no mundo corporativo. A “perspectiva funcionalista”, como é chamada pelos pesquisadores, defende que a hierarquia é essencial para a coordenação, a clareza de papéis e a eficiência das equipes. Mas, como a pesquisa demonstrou, essa ideias se baseia em poucos estudos e pode ser superestimada.
Quando a hierarquia é mais prejudicial:
O artigo identifica três fatores que intensificam os efeitos negativos da hierarquia:
- Instabilidade de membros: quando há alta rotatividade na equipe, a hierarquia se torna ainda mais problemática, pois as relações de poder e status precisam ser constantemente renegociadas, aumentando a instabilidade e os conflitos.
- Diferenciação de habilidades: times com profissionais de diferentes áreas de especialização são mais propensos a conflitos em um contexto hierárquico. As diferenças de expertise podem gerar disputas por reconhecimento, influência e recursos.
- Mutabilidade da hierarquia: se a base da hierarquia (ex: status, poder) é mutável e os critérios de ascensão são pouco claros ou subjetivos, a incerteza e a instabilidade geradas aumentam a competição e os conflitos entre os membros.
É verdade que a hierarquia pode ser benéfica em situações específicas, como em tarefas ambíguas, com pouca clareza sobre os objetivos e os processos. Nesses casos, a hierarquia pode ajudar a trazer ordem e direção, agindo como um farol em meio à névoa.
O artigo encontrou apenas uma situação em que a hierarquia pode ter um impacto positivo:
- Tarefas ambíguas: quando as tarefas são pouco claras e se tem poucas informações sobre o contexto, a hierarquia pode ser benéfica ao fornecer estrutura imediata, facilitando a coordenação da equipe.
Mas atenção: essa é a exceção, não a regra. E mesmo nesses casos, é preciso ter cuidado para que a hierarquia não se torne um obstáculo à criatividade, à iniciativa e à colaboração entre os membros da equipe.
Libertando o Potencial das Equipes: Alternativas à Hierarquia Tradicional
A boa notícia é que existe uma saída para essa armadilha. Empresas modernas ao redor do mundo estão mostrando que é possível ter sucesso com estruturas mais horizontais, flexíveis e colaborativas.
Ao invés de se apegar a modelos ultrapassados, essas organizações ousadas estão desafiando o status quo. Elas experimentam modelos como a autogestão ou outras formas de organização que priorizem a autonomia, a comunicação aberta e a colaboração entre os membros da equipe.
Veja aqui uma lista de 50 organizações que a Corporate Rebels compilou.Todas elas desafiam a noção tradicional de hierarquia(e a Target Teal é uma delas)!
Para te ajudar nessa jornada, separamos algumas dicas práticas para líderes e gestores que desejam reduzir a hierarquia em suas equipes e liberar o potencial máximo de seus times:
- Revisite suas concepções sobre liderança: leia mais sobre as novas concepções de liderança e abandone a visão equivocada do líder heróico.
- Distribua autoridade: vá além da delegação e distribua a autoridade de forma efetiva nos seus times com a autogestão.
- Crie espaços para conversas difíceis: crie um ambiente onde todos se sintam à vontade para expressar suas ideias, opiniões e sugestões, independentemente de sua posição na hierarquia.
- Implemente sistemas de recompensas baseados em colaboração: valorize o trabalho em equipe e incentive a cooperação entre os membros da organização, ao invés de promover a competição individual.
Conclusão
A hierarquia tradicional, com seus níveis rígidos de poder e status, é uma armadilha que pode estar limitando o potencial das suas equipes. Ao invés de se apegar a modelos ultrapassados, ouse desafiar o status quo e buscar alternativas mais eficazes.
O futuro do trabalho pertence a equipes autônomas e liberadas das amarras da hierarquia.
Nós somos referência quando o assunto é autogestão e novas formas de trabalho. Nosso blog é um repositório enorme sobre prática de design organizacional que promovem a reinvenção das organizações sem a necessidade de chefes(mas tudo bem, se você não estiver no momento de acabar com a hierarquia nós podemos te ajudar também). Conte com a Target Teal para te ajudar a encontrar caminhos e formas de construir organizações menos tóxicas. Chama a gente para um café e vamos conversar sobre isso!
Este artigo foi elaborado com base na pesquisa “Why and When Hierarchy Impacts Team Effectiveness: A Meta-Analytic Integration”, de Lindred L. Greer, Bart A. de Jong, Maartje E. Schouten e Jennifer Dannals, publicada no Journal of Applied Psychology em 2018. A pesquisa, através de uma meta-análise de 54 estudos, investigou os impactos da hierarquia na efetividade das equipes, explorando os mecanismos de mediação e os fatores contextuais que influenciam essa relação. As informações e conclusões apresentadas neste artigo refletem as descobertas e análises dos autores do estudo original.