As relações de poder nas organizações são as principais fontes das mazelas que afligem o mundo corporativo. Um amigo resumiu bem o cenário encontrado:
“ As grandes corporações são constituídas por exércitos de pessoas que fabricam power points, e que se encontram regularmente em salas de reunião para ver quem consegue mostrar quem tem mais influência ou poder sobre o outro. ”
Infelizmente, é uma visão que compartilho.
Assédio, burnout e baixos níveis de colaboração são outros sintomas de um sistema que possui relações de poder centradas na dupla chefe-subordinado. Indo além, quando estruturamos o trabalho a partir de uma cadeia de comando, abrimos espaço para relações de poder pouco saudáveis.
Para entendermos melhor como o poder existe nas organizações, vamos apelar ao Max Weber que diz que o poder é “a possibilidade de impor a própria vontade sobre a conduta alheia, dentro de uma relação social”. Ele também diz que o poder legítimo tem três fontes:
- A lei
- A tradição
- O carisma
Como as regras (a lei) moldam as relações de poder
Uma organização precisa seguir leis externas, que por exemplo, definem que o responsável legal tem o poder de assinar contratos, pegar empréstimos, demitir pessoas, etc. Ao mesmo tempo existem regras internas que podem reforçar a concentração de poder em quem é dono, ou em poucas pessoas no topo.
São essas regras internas (explícitas ou tácitas) que na maioria das vezes determinam que existe uma cadeia de comando, o que coloca o destino do seu emprego e carreira nas mãos de seu superior. Além disso, o próprio uso de seu tempo e energia está condicionado ao que ele acha melhor. É essa imposição da vontade alheia em uma relação social que Weber se referia.
Como a tradição e o carisma são fontes de poder
A tradição pode ser interpretada como um conjunto de pressupostos culturais compartilhados dentro de uma sociedade ou organização. Dessa maneira, é possível que em uma organização, os profissionais envolvidos com a venda dos produtos tenham mais poder e influência por conta da organização ter sido fundada por um vendedor e essa categoria de profissionais sempre ter sido valorizada.
A influência da tradição nas relações de poder não se aplica apenas a um grupo de profissionais, mas a um departamento, região, gênero, papel social, etc.
O poder que vem do carisma se dá exclusivamente pelas características individuais de cada um, independente da tradição ou da lei. Admiração, respeito pela competência demonstrada e até o afeto são motivos comuns que levam a isso.
Como as relações de poder nas organizações criam problemas
Acredito que existem três condições para que a maneira como lidamos com o poder nas organizações acabe criando problemas:
- O poder está altamente concentrado e não existem mecanismos para aliviar essa concentração.
- O poder é visto como algo escasso e finito. Para um ter mais, o outro tem que perder.
- O poder e como ele está distribuído é tabu e não aparece nas conversas abertas.
O assédio moral, que acontece com muito mais frequência do que gostaríamos, tem como principais causas as relações de poder extremamente desiguais somadas a inexistência de canais para denúncia que são acessíveis à todos.
Mas existem efeitos mais sutis. Quando uma pessoa tem grande poder sobre seu destino na organização e até de sua carreira, é razoável imaginar que você dará uma atenção especial a ela. Alguns chegam a se preocupar apenas com a avaliação que essa pessoa fará dela no final do ano. O propósito da pessoa deixa de ser gerar valor para a organização e torna-se apenas satisfazer as vontades e necessidades do superior. Essa estratégia (também chamada de puxa–saquismo) é bastante eficaz (e danosa ao mesmo tempo) e acontece em diferentes graus de intensidade.
Quando você tem um grupo de pessoas que faz de tudo para te agradar, é natural que você tenha uma autoimagem distorcida. Já reparou que quanto mais você sobe na hierarquia, menos feedbacks difíceis você recebe? As pessoas chegam a evitar contar noticias ruins para quem está no topo da hierarquia. Isso gera um efeito já estudado que eu chamo de “chefe-poliana’, pois tudo parece ir muito bem para quem está no papel de chefe.
Em ambientes organizacionais onde o poder é visto como algo escasso, surge uma competitividade tão comum quanto violenta. Em uma pirâmide, a cada degrau menos posições existem, e mostrar-se melhor que os outros é o único caminho para a ascensão. Fofocas e politicagem atingem volumes e qualidades que assustam.
Para se tornar um profissional de sucesso, as pessoas protegem seus departamentos e acusam as outras áreas de causarem problemas. O poder também precisa ser dividido entre diretorias, e não comum, guerras se instalam.
Trabalhando nos sintomas e não nas causas
Diante dos problemas citados, muitas organizações pensam em soluções paliativas. Atacam os sintomas e esquecem das causas.
Uma caminho muito comum é fingir que nada acontece. Abusos, conflitos e sabotagens são abafados. A ilusão aqui é que se não falarmos sobre os problemas, eles vão sumir. Claro que todos falam, mas nos corredores, no café, ou para o advogado trabalhista depois de sair da empresa.
Outro caminho é acreditar que o problema está em indivíduos isolados. Troca-se um gestor e acham que tudo vai mudar. Olha, não estou dizendo que devemos tolerar gestores que assediam seus subordinados. Longe disso. Estou só dizendo que na maioria das vezes são mudanças paliativas e que os problemas são estruturais e culturais.
Algumas empresas lançam aqueles programas ou treinamentos que procuram promover o empoderamento. Mas falham miseravelmente. Se existe a necessidade de gerentes emponderarem seus funcionários, é porque estruturalmente o poder está concentrado nas mãos de poucos e é visto como algo que é passado de pessoa a pessoa.
Como lidar com o poder nas organizações
Vamos olhar novamente para as causas dos problemas e entender como podemos contrapô-las.
- O poder está altamente concentrado e não existem mecanismos para aliviar essa concentração.
A não ser que a propriedade da sua organização seja distribuída, ou seja, todos são sócios, cooperados ou fazem parte de uma org-rede, você já começa com uma concentração imposta por lei, pois o dono tem prerrogativas que nenhuma outra pessoa tem.
O desafio que se aponta como uma solução possível é criar estruturas que distribuem a autoridade. Definindo autoridade como a atribuição formal de poder de decisão a alguém. Para entender melhor, leia sobre como promover a autogestão.
Essas estruturas trabalham nas regras e na lei para distribuir o poder. A tradição (cultura) e o carisma permanecem aumentando ou diminuindo a concentração. Quando as pessoas começarem a seguir as novas regras (da autogestão) de maneira automática, aí a tradição começa a trabalhar a favor.
- O poder é visto como algo escasso e finito. Para um ter mais, o outro tem que perder.
O poder que estamos acostumados é o poder sobre o outro. Precisamos reconhecer e validar o poder que eu ganho por trabalhar com o outro. Esse segundo poder não é escasso, ele cresce quanto mais colaboramos em prol de um propósito em comum.
Para que pessoas de uma organização compartilhem dessa percepção, precisamos trabalhar a cultura da organização de maneira consciente. Olhar para as histórias que contamos e as que gostaríamos de contar. Um abordagem que ajuda nisso é o Design Cultural.
- O poder e como ele está distribuído é tabu e não aparece nas conversas abertas.
Agora que você está mais consciente sobre como as relações de poder afetam o ambiente organizacional, falta levar essa conversa para dentro da organização.
Se existe um tabu, e se você não consegue questioná-lo, considere pedir ajuda e angariar aliados antes de falar em um forum mais aberto.
No final é preciso jogar com as relações de poder como elas estão no presente se você pretende mudá-las.
Se você precisar de alguma ajuda, nós da Target Teal estamos aqui. Quer marcar um bate-papo para falarmos sobre isso?
[…] Precisamos falar sobre o poder. Temos receio, medo ou até trauma sobre o poder, mas ele é de suma importância. Para ajudar, vamos separar em dois tipos. O primeiro é o poder sobre o outro. O segundo é o poder com o outro. O primeiro causou um trauma em nossas vidas que atrapalha o nosso entendimento e relacionamento com o segundo poder. […]
[…] aparente paradoxo existe porque o poder pode ser dividido em dois tipos: poder sobre o outro e poder com o outro. Na autogestão buscamos maximizar o poder com o outro e […]
[…] a realidade, o mundo do trabalho não é populado por psicopatas manipuladores que querem manter o poder. Na maior parte dos casos, as hierarquias e diferenças se mantêm simplesmente pela força do […]
[…] se as estruturas de trabalho fossem diferentes? E os processos? Como o poder é distribuído? Os relacionamentos? A […]
[…] Bastos, R. (2018, January 20). O Poder nas Organizações – Target Teal. Targetteal.com. https://targetteal.com/pt/blog/poder-nas-organizacoes/ […]
[…] be the reality, the world of work is not populated by manipulative psychopaths who want to maintain power. In most cases, hierarchies and differences are maintained simply by force of habit. That is, in […]