O tema feedback suscita desconfortos e até trauma na maioria das pessoas que já vivenciou um ambiente corporativo. Em um processo de transição para autogestão usando o O2, o tema ainda pode gerar grande ansiedade no início, pois a figura tradicional do gestor de pessoas, é posta em cheque. “Quem me dará feedback?” algumas pessoas perguntam. Se você ainda não conhece a tecnologia social O2 e como ela pode te ajudar a adotar práticas de autogestão, dá uma lida aqui. Por mais que esteja escrito nos meta-acordos que é responsabilidade do Elo Externo oferecer feedback para melhorar a adequação da pessoa em um papel, ainda é confuso para muitos o que é isso na prática. E esse feedback de adequação não é bem o feedback que as pessoas estão acostumadas a receber (ainda bem). Para aliviar essa tensão precisamos primeiro esclarecer o que enxergo serem dois tipos distintos de feedback dentro do O2.

Feedback de adequação

Como a pessoa X, desempenha o papel Y, ou seja:
  • Como ela desempenha as responsabilidades daquele papel
  • Se ela atua além das responsabilidades descritas, buscando o propósito
  • Como ela pode melhorar sua atuação naquele papel

Feedback entre pessoas

Como a pessoa X sente-se ao trabalhar com a pessoa Z e vice-versa, ou seja:
  • Qual é o impacto das ações de X em Z e vice-versa
  • Que sentimentos X tem em relação às ações de Z e vice-versa
  • Como X e Z podem se comunicar de maneira a fortalecer os laços de confiança e o espaço tribal
Repare que o primeiro feedback trata principalmente de temas pertencentes ao Espaço Organizacional, enquanto o segundo trata de questões do Espaço Tribal. Quando separamos os dois, podemos aplicar estratégias distintas e isso permite honrarmos o propósito organizacional e as relações humanas aí presentes. O custo é muito alto quando negligenciamos um em prol do outro.

Trocando Feedback de Adequação

Se sua organização segue uma versão sem alterações dos meta-acordos, cada círculo possui um Elo Externo e ele tem a atribuição de alocar pessoas em papéis e dar feedback de adequação. Porém, como sabemos, uma responsabilidade não limita a ação das outras pessoas. Portanto, todos podem dar feedback de adequação. A questão que fica, às vezes, é que não existe um hábito. Pode ser bem importante oportunizar momentos para que todos possam trocar feedback, por isso me inspirei no Feedback Canvas do Matheus Haddad para criar um outro tipo, específico para o feedback de adequação.  O fluxo da sessão começa com uma explicação do que seria esse tipo de feedback e a entrega de uma folha de canvas de Feedback de Adequação para cada papel que as pessoas fazem. Assim, se fulano desempenha 4 papéis naquele círculo, ele recebe 4 folhas. Segue um layout que pode ser usado: feedback de adequação - canvas Após isso, o facilitador passa a seguinte instrução:
  1. Preencher uma folha para cada papel (30min)
  2. Colar suas folhas na parede
  3. Dar feedbacks em post its nas folhas dos colegas (30min)
  4. Classificar os feedbacks recebidos como Reconhecido (nota de 1 a 5) e Importante (nota de 1 a 5) (5min)
  5. Dar ultima olhada em todos as folhas que você deixou feedbacks (10min)
  6. Não se contentar com essa sessão, continuar buscando feedbacks ou buscar esclarecimentos fora da sessão.
Reparem que pode existir aqui um tipo específico de feedback que na verdade é a manifestação de uma expectativa implícita. Por exemplo, existe um papel de Infraestrutura do site, e nele não consta uma responsabilidade que diz: “Fazer back-ups regulares do site.”. Neste contexto, dar um feedback como “Você poderia ter feito back-ups, para evitar os problemas que tivemos” seria uma expectativa implícita que poderia ser melhor resolvida no modo Adaptar, com a proposta de uma nova responsabilidade.     Outra coisa importante notar, é que no Feedback de Adequação é bem mais fácil seguir os princípios de um bom feedback: específico, objetivo, acionável e solicitado. Esses mesmos princípios são mais difíceis de aplicar no segundo tipo, o feedback entre pessoas.

Trocando Feedback entre Pessoas

Engraçado, todos os feedbacks são entre pessoas. Escolhi esse nome para reforçar que existe uma relação humana subjetiva e complexa aqui. E não podemos resumir essa conversa em um formulário, post-it e  muito menos em uma matriz 3×3. ;) Aqui é o foco é fortalecer o espaço relacional, por meio de conversas um-a-um. Não estamos mais interessados em feedbacks de adequação, mas como cada um se sente em relação às ações do outro. O conselho do Davi no texto sobre feedback se encaixa com perfeição aqui:
“Você só pode mudar a si mesmo. Talvez você possa oferecer informações e fazer pedidos que podem impactar os outros. Mas se isso não der certo, foque em você. Afinal, quando você quer dar um feedback não é sobre a outra pessoa. É sobre as suas necessidades.”
Estamos buscando criar um espaço para as pessoas terem conversas profundas e às vezes difíceis, por isso é importante olhar para como as pessoas estão familiarizadas com práticas e princípios da comunicação não violenta (CNV). Se você está em um ou vários círculos e gostaria de promover um momento específico de troca de feedback entre pessoas, você pode propor uma sessão com instruções bem simples, como abaixo:
  • Se você está sentado com um colega em uma dupla, então vocês estão trocando feedback.
  • Se você está de pé, então está esperando para ser chamado ou esperando alguém para chamar para trocar feedback.
  • Aproveite da melhor maneira possível esses 90 minutos.
Vale relembrar as pessoas de aproveitarem esse momento para celebrar a qualidade das relações, a confiança e a generosidade das pessoas. Não estamos apenas querendo ter conversas difíceis, mas também as prazerosas. A prática regular de conversas um-a-um com princípios de CNV pode ajudar muito na manutenção de um espaço tribal saudável.

E o restante das coisas atreladas ao feedback?

Sempre é bom reforçar o propósito de cada prática e conceito proposto. As sugestões que coloquei aqui não tem como objetivo criar um mecanismo para definir salários, remuneração variável, etc. Escrevi outro texto sobre isso, aqui. Minha intenção foi só fortalecer a prática da troca de feedback dentro de uma organização que está praticando o O2 e restaurar a confiança de que podemos nos ajudar em nossa jornada de desenvolvimento. Para mim, isso já é algo incrível e por vezes suficiente.
Se você quer ajuda para mudar a cultura de feedback dentro da sua organização, pode contar com a Target Teal.  Vamos tomar um café?  

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Sobre o(a) autor(a): Rodrigo Bastos

Rodrigo é facilitador e designer organizacional. Formado em Engenharia de Materiais pela POLI-USP. Atuou por mais de 10 anos na criação e condução de programas de desenvolvimento de times e líderes utilizando a educação experiencial como método. Já foi engenheiro e gestor. Apaixonado pelo trabalho com organizações, hoje ele acredita que atuando no sistema social e não nas pessoas, consegue contribuir mais e ser muito mais feliz.

2 Comments

  1. Dyego Cantu 2 de abril de 2019 às 11:02 - Responder

    Sensacional Rodrigo! Acredito que mesmo em organizações que não usem O2 essa dinâmica é válida, principalmente pelos efeitos em separar o que é o espaço organizacional e o tribal e agir adequadamente. Uma dúvida, já realizou essas etapas do feedback em momentos diferentes? Se sim, vê algum ponto negativo? Penso em fazer assim para times que tem sido difícil reunir por um período inteiro.

    • Rodrigo Bastos 2 de abril de 2019 às 17:01 - Responder

      Olá Dyego, acho que fazer em momentos diferentes funciona sim. Só deixe claro isso. Também que pode ser útil para quem não usa o O2, mas se você não tem uma estrutura clara e adaptativa de papéis, o feedback de adequação tende a não ser muito fácil e ou bom.

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