O modo sincronizar da Organização Orgânica não é só uma reunião para resolver uma lista de tensões levantadas pelos participantes. Este ritual simples pode ser potencializado com perguntas poderosas feitas pelo facilitador que levam os participantes a se responsabilizarem pelas suas percepções e agirem a partir disso. Neste texto descrevo o padrão “Perguntas Poderosas”, bastante utilizado no início da prática do Sincronizar. Para conhecer mais sobre Organização Orgânica, acesse esta página ou baixe este ebook.

Contexto

Um círculo que está iniciando sua prática do modo sincronizar no O2 e que ainda apresenta hábitos ou sombras relacionadas à estrutura de poder antiga, seja a busca pela apreciação do grupo (consenso) ou do antigo chefe.

Forças

Alguns antipadrões costumam se manifestar na prática do modo sincronizar, que geralmente representam hábitos já adquiridos ou uma cultura organizacional incompatível com a autorresponsabilização. O “Tudo é de Todos” leva os indivíduos a transferirem sua responsabilidade ao grupo, que é uma entidade abstrata e incapaz de tomar ação. A busca pelo consenso ou apreciação de todos antes de tomar ação pode ser tão frequente que leva a aumento exponencial da lista de tensões e portanto torna a reunião de círculo o único espaço para resolver os problemas, ainda de uma forma disfuncional. Outro antipadrão envolve a pessoalização, ou seja, pedidos são endereçados a pessoas, e não aos papéis presentes no círculo. Isto aumenta a frequência dos atos heróicos (quando os participantes agem fora dos seus papéis ou quebram os Meta-Acordos) e torna o círculo cego à estrutura organizacional, levando todos a uma inconsciência dos acordos estabelecidos. Por fim, o antipadrão “Perfeito que nunca é feito” (ainda não descrito) também pode estar presente, onde o grupo não consegue dar o próximo passo e fica preso em uma discussão sem fim.

Problema

Precisamos de um modo sincronizar efetivo, capaz de fazer as pessoas a refletirem sobre seus hábitos e invocarem a estrutura organizacional definida. Precisamos parar de atribuir tudo a todos e nos responsabilizarmos pelas nossas percepções e tensões.

Solução

Durante o modo sincronizar, o facilitador pode usar uma ou mais das “Perguntas Poderosas” para revelar algum antipadrão presente ou ajudar o participante que está tratando sua tensão a encontrar um caminho. Para começar cada item da lista de tensões, o facilitador pode perguntar:
  1. Qual é a sua tensão? O que você precisa?
Ambas as perguntas colocam o foco em quem está trazendo a tensão, buscando que a pessoa se responsabilize e também reduzindo a chance do participante manifestar o antipadrão “Tudo é de Todos“. As perguntas também fazem um convite para o participante expressar suas necessidades individuais e centrar sua perspectiva a partir daquilo que ele vê ou percebe. Quando a discussão chega em um ponto em que parece que os participantes estão tentando buscar uma solução perfeita para a tensão, talvez o grupo esteja manifestando o antipadrão “Perfeito que nunca é feito”. Neste caso, duas perguntas podem ser valiosas:
  1. Qual é o próximo passo? Qual o projeto ou ação mais simples que pode ajudar você a seguir em frente?
Estas perguntas mostram ao participante que trouxe a tensão que não é necessário buscar uma solução perfeita ao problema em questão. O que importa é dar um próximo passo. Alguns participantes acreditam que a reunião de círculo é o único momento de interação “oficial” entre os membros de o círculo, e por isso acabam querendo discutir tudo naquele momento. Este antipadrão pode ser intensificado pelo “Tudo é de Todos“, quando além de buscar uma solução perfeita, os indivíduos ainda precisam que ela seja aprovada ou apreciada pelo grupo. Para revelar a estrutura atual e mostrar para os participantes que o que importa são os acordos de papéis, círculos e restrições já definidos, o facilitador pode usar:
  1. Qual papel tem a autoridade para decidir isso? Existe algum papel que hoje cuida disso?
  2. Existe algum artefato ou restrição que impeça a sua ação?
  3. Você está esperando que alguém faça isso?
O foco neste caso é ajudar o participante a fazer um pedido claro. O primeiro passo é verificar o que diz a estrutura a respeito do pedido sendo feito. Se já existir um papel que cuida daquilo, basta encaminhar o pedido àquele papel. Se ele for de outro círculo, o Elo Interno pode ajudar. Se não existir um papel, o facilitador pode ajudar o participante a pedir um ato heróico ou então propor uma responsabilidade ou novo papel no modo adaptar. Se tudo indica que é o próprio participante que possui um papel responsável, o facilitador pode verificar o que ele ou ela quer fazer:
  1. Dado que você tem autoridade para fazer isso, o que você precisa?
  2. Você gostaria de consultar ou ouvir a opinião das pessoas?
Estas duas perguntas finais evitam que o participante transfira a sua responsabilidade para outros. Mesmo tendo a responsabilidade de fazer algo, qualquer pessoa pode pedir ajuda ou conselhos. Mas isso deve ficar explícito, para evitar que haja uma projeção da insatisfação dele ou dela no grupo. Ao fazer todas estas perguntas, o facilitador deve buscar acolher a tensão e as necessidades do participante em questão. É importante não desqualificar a percepção dele ou dela, ou pior, descartar a tensão trazida considerando-a “inadequada”. Não existem tensões inadequadas, apenas estratégias mais ou menos efetivas para tratá-las dentro do O2.

Gatilhos

Alguns gatilhos podem ser úteis para o facilitador perceber quando o grupo demanda o uso de uma ou outra pergunta poderosa. Mas atenção! Isto não é uma receita de bolo. É sempre necessário analisar o contexto. Perguntas Poderosas:
  1. Qual a sua tensão? O que você precisa?
  2. Qual é o próximo passo?
  3. Quem tem autoridade para decidir isso?
  4. Existe algum artefato ou restrição que impeça a sua ação?
  5. Você está esperando que alguém faça isso?
  6. Dado que você tem autoridade para fazer isso, o que você precisa?
  7. Você gostaria de consultar ou ouvir a opinião das pessoas?
Gatilhos:
  1. Ao iniciar uma tensão: A
  2. Quando não há clareza do pedido que o participante está fazendo: A
  3. Quando a discussão se prolonga e não há um encaminhamento: B
  4. Quando antigos gestores são mencionados: C
  5. Quando o participante usa a primeira pessoa do plural, como nas falas “nós precisamos decidir isso” ou “nós temos que fazer algo”: C
  6. Quando o participante menciona o grupo e busca consenso: C
  7. Quando o participante assume que ele não tem autonomia: D
  8. Quando o participante busca que alguém faça algo que ainda não está explícito: E
  9. Após verificar que o participante tem autonomia para executar algo que ele estava pedindo: F
  10. Quando o participante busca consenso, apesar de ter autonomia para executar o pedido: G

Contexto resultante

Utilizando as “Perguntas Poderosas”, círculos tendem a ganhar mais consciência dos seus acordos e hábitos. Referenciar a estrutura organizacional constantemente leva também ao refinamento dos papéis, círculos e restrições, e tem potencial de reduzir o número de atos heróicos. A sombra da estrutura de poder anterior diminui em função do fortalecimento dos novos acordos.

Fundamentação

Algumas destas perguntas derivam da prática de “Reunião Tática” da Holacracia. Outras – como a que questiona o próximo passo – são altamente influenciadas pelo método Getting Things Done do David Allen (A Arte de Fazer Acontecer, em português).

Usos conhecidos

Este padrão é praticado em quase todas as organizações que iniciam sua jornada na Organização Orgânica.

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Sobre o(a) autor(a): Davi Gabriel Zimmer da Silva

Davi é designer organizacional e facilitador na Target Teal, especializado em melhorar interações entre times e indivíduos no ambiente corporativo. É pioneiro na prática de Holacracia no Brasil e co-autor da Organização Orgânica, uma abordagem brasileira para autogestão. Davi é formado em Sistemas de Informação pela UNISINOS e pós-graduado em Psicologia Positiva pela PUCRS. É amante dos temas desenvolvimento humano e de organizações, produtividade, futuro do trabalho e cultura organizacional.

5 Comments

  1. Claudia 28 de março de 2019 às 13:20 - Responder

    Adorei o texto leve e pratico. E posso falar? Me inspiro muito em alguns conteúdos para levar para empresas tradicionais. Ajuda muito as pessoas

  2. Bernardo William Cafiero Viana 28 de março de 2019 às 15:32 - Responder

    Essas perguntas poderiam estar na próxima versão do Kit do Facilitador eim? Aí unificaria tudo em um lugar só. Como um iniciante na facilitação, acho interessantes poder consultar essas perguntas.

    • Davi Gabriel da Silva 28 de março de 2019 às 18:07 - Responder

      Pode crer, Bernando, vamos incluir na próxima versão!

  3. Erik 28 de março de 2019 às 15:44 - Responder

    Muito bom, excelente forma de resumir com gatilhos e as perguntas mais adequadas.

  4. Maxsuel Todaka 20 de dezembro de 2021 às 11:54 - Responder

    Show, todo gestor precisa dessas habilidades, como diz no texto, isso não é uma receita de bolo, mas da uma ideia muito bacana de como conduzir uma reunião, conflito, tensão…

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